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10 de abr. de 2011

Agora falando sério

O artigo que transcrevemos abaixo (e que você confere também no YouTube) foi escrito por Jô Soares, na coluna semanal que publicava no Jornal do Brasil. Jô, ao receber seu Troféu Imprensa, na premiação dos melhores de 1987, retirou do bolso folhas datilografadas de seu texto, e pediu permissão de Silvio Santos para lê-lo.



Agora falando sério
Por Jô Soares

Em 1947, os grandes produtores de Hollywood se reuniram no hotel Waldorf-Astoria, em Nova Iorque, e resolveram que artistas com tendências políticas em desacordo com seu ideário não trabalhariam mais em filmes. Surgia a lista negra e a conseqüente caça às bruxas. Em pouco tempo, não somente radicais ou liberais eram perseguidos; qualquer artista que desagradasse aos chefes de estúdio era listado e não conseguia mais trabalho.

Com impecável senso de oportunidade, a TV Globo escolheu exatamente o momento da Constituinte no Brasil para inaugurar sua lista negra. Quem sair da emissora sem ter sido mandado embora corre o risco de não poder mais trabalhar em comerciais, sob a ameaça de que estes não serão lá veiculados. Como a rede detém quase o monopólio do mercado, os anunciantes não ousam nem pensar em artistas que possam desagradá-la.

Neste ponto, alguém pode achar que eu estou falando por interesse pessoal. Garanto que não.

Não falo pelo fato de os meus comerciais não poderem ser exibidos, nem pelo fato mais recente, das chamadas pagas do meu novo espetáculo no Scala 2 “O Gordo ao vivo” terem sido proibidas. Sou um artista muito bem remunerado e meus espetáculos têm outros meios de divulgação. Graças a Deus meus shows de humor já lotavam teatros antes que eu fosse para a Globo.

Que as chamadas de “O Gordo ao vivo” não passariam na emissora eu já sabia desde outubro, pelo próprio Boni, que me disse em sua sala quando fui me despedir:

– Já mandei tirar todos os seus comerciais do ar. Chamadas do seu novo show no Scala 2, também, esquece. Estou vendo como te proibir de usar a palavra ‘gordo’. – claro que esta última ameaça ficou meio difícil de cumprir: a megalomania ainda não é lei fora da Globo.

Logo, não é por isso que escrevo pela primeira vez sobre esse assunto. Saí da Globo, onde conservo grandes amigos, com a maior lisura, e nunca me aproveitei deste espaço, ou de nenhum espaço, em causa própria.

Escrevo, isso sim, porque atores que trabalham no meu programa, como Eliéser Mota, como Nina de Pádua, foram vetados em comerciais. As agências foram informadas, não oficialmente, é claro – como acontece em todas as listas negras – que suas participações não seriam aceitas.

É triste, nesse momento, em que se escreve diariamente a democracia no Congresso, que uma empresa que é concessão do Estado cerceie, impunemente, o artista brasileiro, de um modo geral já tão mal remunerado.

Finalmente, eu gostaria de dizer que Silvio Santos foi tremendamente injusto quando chamou Boni numa entrevista de “office-boy de luxo”. Nenhum office-boy consegue guardar tanto rancor no coração.


Encerrada a leitura, o auditório e o júri do Troféu Imprensa aplaudiram vigorosamente Jô. Em seguida, falou Silvio Santos:

– Eu faço minhas as suas palavras. E é uma pena, senhores telespectadores, é uma pena que uma rede de televisão com este comportamento ainda seja a primeira colocada em audiência em todo o Brasil e uma das melhores emissoras de televisão do mundo. É uma pena que a Rede Globo de Televisão tenha esse procedimento. É uma pena. Queira Deus que o doutor Roberto Marinho seja mais uma vez iluminado para que estas atitudes não sejam freqüentes na Rede Globo de Televisão.


Os tempos mudaram e dificilmente a Rede Globo teria o mesmo comportamento hoje. Fica o registro de um momento histórico da televisão brasileira.

2 comentários:

  1. Chico Anísio dentre outros sofreram ou sofrem com a "geladeira" da Globo. Acho que não mudou muito não essa situação, e se mudou, foi para a pior. Pois agora não chegamos nem a saber dos casos. Ninguém pode imaginar o motivo que fez Jô voltar com o rabo entre as pernas. O dinheiro não é a única explicação. podemos apenas supor que tipo de chantagem ele pode ter sofrido...

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  2. Estou procurando o artigo no Acervo JB. Salvo engano, nessa época, o Troféu Imprensa era exibido no domingo posterior ao Dia das Mães. Então, a data provável de publicação foi 14/05,1988.

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